As últimas semanas passaram por mim como um borrão. Estive inquieta, agitada, com picos de energia altíssimos, teimosamente duradouros, viciada em pensar em trabalho, fluente em algoritmos, dias e dias acordando antes do despertador, em sobressaltos. Foram muitas horas de corrida e de musculação com música explodindo nos fones para (tentar) gastar essa coisa pulsando dentro de mim. Higiene do sono. Chá de camomila. Vinho também, por que não? Vídeos de ASMR no YouTube. Exercícios de respiração. Enquanto isso, pouca leitura, pouquíssima, e quase nenhuma escrita. Para uma, faltou concentração; para a outra, simplesmente não houve ânimo para desfazer o emaranhado de anseios que foi se formando dentro de mim, quem dirá para traduzi-lo em palavras. Confesso que não insisti muito. Deixa estar, é o que repito insistentemente. Deixa estar. O caos também precisa ter sua vez.
Menti descaradamente para mim mesma: onde pensei estar abraçando o caos, o que fiz, mais uma vez, foi tentar discipliná-lo. Silenciá-lo. Acho que acabei por silenciar muita coisa junto com ele.
Estas são as primeiras palavras escritas que fluem para fora de mim em um bom tempo. Escrevo-as sentada diante do notebook em um dos meus cafés favoritos da cidade, abraçada pelo dia nublado e pelo alívio de sentir o impulso de expressão rebelar-se contra minhas táticas militares que o comprimem. Hoje acordei apenas com o barulho do despertador, com direito a mais quinze minutos de soneca. Levantei-me devagar, deixei a academia para mais tarde. Escolhi um novo livro na estante para começar: Colchão de pedra, da Margaret Atwood. Esperei silenciosamente pelo café passar. Esparramada no sofá, me concedi o privilégio de saborear a preguiça antes de enfiar meu notebook na bolsa e sair. Sinto-me testemunhando um evento sobrenatural: uma névoa ruidosa e densa se dissipando da noite para o dia. Na ânsia por eliminá-la com minhas próprias mãos, perdi todos os sinais de seu desvanecimento, natural e iminente.
Ainda é cedo e o café está relativamente vazio, à exceção de duas mulheres sentadas ao canto. Elas discutem roteiros de cruzeiro e temperos para frutos do mar efusivamente. Uma coletânea de blues toca suavemente ao fundo. Peço um chai latte e contemplo a tela entre palavras. O que assusta mais: o estardalhaço ou o silêncio? Às vezes me pergunto se não me induzo propositalmente a esses períodos barulhentos, justamente quando quero evitar a minha própria quietude. Um alvoroço planejado, um caos ordenado, contido dentro do meu próprio sistema: o crime perfeito para abafar o que só se ouve no silêncio.
Ele encontra seu caminho para prevalecer, e me faz ouvi-lo, vitorioso, em minhas palavras escritas. Ainda bem.
Um beijo,
Mari
Como resultado desse momento tão inquieto e desconcentrado, tenho consumido conteúdo muito mais do que produzido. Semana que vem tem dossiê de dicas do mês para os assinantes pagos, mas hoje também deixo aqui uma coleção de links legais que fizeram parte das minhas últimas semanas, para abrir tudo de uma vez e testar os limites do navegador!
Se você quiser acessar os dossiês pagos, ainda dá tempo de apoiar a news financeiramente antes de receber o próximo - e, até lá, se atualizar com os anteriores. :)
📔 O quanto as capas de livros de romance mudaram ao longo das décadas?
🗺️ Strange Maps é um portal que reúne mapas estranhos (e incríveis), que se propõem a mostrar o mundo visualmente por ângulos não-convencionais. Passei mais tempo nele do que gostaria.
📽️ Os melhores filmes alto-astral pra dar aquele up nos ânimos.
💻 Será que o LinkedIn ficou esquisito? (sim, ficou.)
🎨 Um projeto visual da The Pudding sobre a importância de reconhecer e nomear a complexidade das nossas emoções.
🤗 Como ser feliz em um mundo projetado para te deprimir.
🥒 Você é uma pessoa, não um picles - conservação não é tudo. (Melhor conselho dos últimos tempos!)
🤓 Querendo fazer todos os cursos autoformativos da escola do Itaú Cultural - são gratuitos e online :)
Os sons que têm embalado meus dias 🎧
Uma playlist com um pouco de tudo que tem estado nos meus fones de ouvido nessas últimas semanas.
Eu ia amar ler um livro seu, sua escrita é muito incrível <3
Estou exatamente presa no caos em que você se encontrava. Tá difícil sair! Pelo menos tenho conseguido ler, mas ido na academia menos do que o de costume. Hoje eu fugi! To aqui no metrô indo tomar um banho de arte para ver se volto para o eixo ou, pelo menos, encontro um cadinho de equilíbrio.